Por Cássia G. Goçalo
Muitos não sabem, mas a maioria dos peixes que habitam os oceanos liberam suas células reprodutoras (óvulos e espermatozoides) no ambiente marinho, onde ocorre a fertilização formando os ovos. Peixes como sardinhas, garoupas, bijupirás e atuns apresentam essa estratégia e são capazes de produzir milhões de ovos. Ao fim do desenvolvimento do embrião, após 24 horas (mais ou menos, dependendo da espécie), sucede o nascimento (eclosão) de uma pequena larva.
Para que essa pequena larva sobreviva no ambiente, é necessário que o alimento (organismos do zooplâncton, leia mais em Para o plâncton, tamanho é documento...) seja ideal, em sua qualidade e quantidade. Afinal, “bebês precisam ser bem alimentados”, para garantir uma boa saúde e continuar crescendo até atingirem a fase adulta. No mar há muitas formas de vida que se alimentam de pequenos organismos, além do mais, ovos e filhotes na natureza são alimentos nutritivos. Os milhões de ovos e larvas são ingeridos por outros peixes e demais animais marinhos, como por exemplo águas-vivas, compondo a cadeia trófica marinha.
Acreditava-se que essa pequena larva ficava flutuando na água do mar durante dias enquanto ocorria o desenvolvimento completo dos olhos, da boca e das nadadeiras. Em meu projeto de doutorado estudei o comportamento dessas pequenas larvas nos primeiros dias de vida e observei que além de flutuarem, elas possuem uma capacidade natatória incrível e são capazes de atingir uma velocidade extremamente alta, até 40 vezes o tamanho do corpo, enquanto nadam e capturam o alimento. E pensar que os homens mais rápidos do mundo nadam a uma velocidade de 1,5 vezes o tamanho do corpo por segundo!
A natação dos organismos marinhos, de modo geral, está relacionada com a alimentação, reprodução e fuga de predadores. Para nadar até o alimento as larvas de peixes precisam movimentar as nadadeiras, dar impulsos, abrir a boca e capturar a presa. Já para fugir de predadores flexionam o corpo e mudam de direção para escapar. Esses padrões comportamentais foram registrados em meus estudos com larvas de garoupas (Epinephelus marginatus) e bijupirás (Rachycentron canadum). Para realizar essa pesquisa nós (eu e a equipe do Laboratório de Sistemas Planctônicos da USP) montamos um sistema óptico, com uma configuração semelhante a de um microscópio, porém no sentido horizontal, possibilitando o estudo com os organismos de tamanhos de 2 a 5 milímetros dentro de um pequeno aquário, sendo observados por uma câmera de vídeo que captura uma alta taxa de quadros por segundos (também conhecida como "supercâmera lenta"). Veja mais em https://www.facebook.com/lapsiousp.
Mesmo com toda essa habilidade, ainda assim, cerca de apenas 1% das larvas sobrevive nos mares. Esta elevada taxa de mortalidade acontece devido à predação e/ou inanição, ou seja, morrem de fome. Uma pequena larva ao passar por todos os desafios, se tornará um peixe adulto atingindo a maturidade, e produzirá uma nova geração de ovos e larvas mantendo um equilíbrio natural entre as espécies e o ecossistema marinho.
O comportamento das larvas de peixes marinhos ainda precisa ser investigado mais a fundo, uma vez que há no ambiente marinho cerca de 16 mil espécies de peixes. Outros estudos abordaram o comportamento de peixes adultos através das filmagens apresentadas pelo National Geographic Channel. Os pesquisadores oferecem diferentes presas e filmam o comportamento natatório e alimentar de diferentes espécies de peixes marinhos. Para os curiosos: acessem a página e assistam o vídeo “Blink of an eye”.
Dúvidas e comentários entrem em contato e mandem mensagens.
Até o próximo post!!!
References:
FUIMAN, L. A. Special considerations of fish eggs and larvae. In: Fuiman, L. A.; Werner, R. G. (eds). Fishery Science: The unique contributions of early life stages. Blackwell Science. p. 1- 32, 2002.
GOÇALO, C.G.; AQUINO, N. A. de; KERBER, C. E.; NAGATA, R. M.; LOPES, R. M. Swimming behavior of cobia larvae (Rachycentron canadum) facing prey and predator. 38th Annual Larval Fish Conference, Quebéc, Canadá. 2014
HOUDE, E. D. Emerging from Hjort’s shadow. J. Northwest Atl. Fish. Sci., v. 41, p. 53-70, 2008.
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