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Brasileira decide continuar sua pesquisa na Europa em meio à pandemia Covid-19

Atualizado: 3 de jul. de 2023

Por Raquel Saraiva

Ilustração: Caia Colla


A pesquisadora Fiamma Abreu sonhou por anos com uma experiência fora do país. Após uma tentativa frustrada na graduação, conseguiu ir para Portugal no final do doutorado, para terminar sua tese sob orientação de um pesquisador muito reconhecido em sua área. Isso ocorreu em fevereiro deste ano, quando os casos do novo coronavírus surgiam na Europa. “Lembro de chegar numa quinta-feira, e na quarta-feira seguinte já não pude ir à universidade. Realmente não é fácil lidar com o final de um doutorado, um doutorado sanduíche e uma pandemia”. Ainda assim, Fiamma segue no país europeu.


Ela trabalha com oceanografia química, especificamente com o risco dos contaminantes orgânicos anti-incrustantes para o ecossistema. “A minha proposta de trabalho é aplicar uma metodologia utilizada na Europa para qualidade dos corpos d'água do Brasil”. Por sorte, o trabalho de campo acabou ainda no Brasil, na Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e agora Fiamma precisa tratar os dados já coletados.


Rotina

O contato com o orientador português foi feito pessoalmente nos únicos três dias que ela foi à Universidade de Aveiro, para onde fez a mobilidade. Hoje é mantido por e-mail e telefone, mesmo ambos estando na mesma cidade. Com os colegas de laboratório, a pesquisadora também troca mensagens. “Todos eles foram bem atenciosos comigo, por ter que lidar com a distância e o rompimento das atividades”.


A rotina de Fiamma se divide entre fazer tarefas domésticas, escrever a tese e assistir o noticiário. Dividindo uma casa no centro de Aveiro com outras duas portuguesas que trabalham e estudam na universidade, a diversão fica por conta dos filmes que assiste com as meninas da casa, nos jogos e nas conversas na varanda. Ainda assim, com a falta do contato direto mais amplo ela sente que está perdendo uma parte importante do intercâmbio “Um dos meus objetivos era ver de perto como a ciência é feita em outro país”.


Além disso, o valor de uma experiência de pesquisa no exterior não está só no laboratório, como já discutimos em um post. Em todos os países da União Européia há restrições. Os museus, parques, centros culturais, restaurantes e lojas estão fechados em Portugal. Fiamma só sai de casa a cada 15 dias, para ir ao mercado. “A experiência cultural de viver em outro país também poderia me enriquecer muito. Não sei quando terei outra oportunidade assim”, lamenta.


Ela iria ainda para um congresso internacional em outro país para apresentar os resultados da sua tese, para conhecer os principais cientistas da área na qual trabalha e ampliar a rede de contatos. “O congresso ainda vai ser realizado virtualmente, mas sei que perderei muito dessas vivências”.


Volta

A responsabilidade de estar no final no doutorado e a chance única de internacionalizar sua tese fizeram Fiamma nem cogitar a volta para o Brasil, além do desconhecimento sobre o novo coronavírus. “Eu não imaginava a proporção que iria tomar”. Além disso, ela defende a tese em agosto, logo após a previsão de seu retorno. “Quero continuar na ciência e a internacionalização atualmente é fundamental para conseguir um pós-doutorado no Brasil. Então acho que não tive muitas escolhas”.


Em meio a esse turbilhão, ao menos ela não teve problemas com o recebimento dos cinco meses de bolsa, referente ao período que pretende ficar em Portugal. As três primeiras mensalidades foram depositadas quando ela ainda estava no Brasil, e as últimas parcelas já foram pagas.


Entretanto, o órgão financiador da sua pesquisa não enviou nenhuma orientação em relação à pandemia para estudantes brasileiros que estão no exterior. “A minha bolsa é CNPq, e não foi me enviado nada, nem por e-mail, nem pela Plataforma Carlos Chagas”. Na seção de imprensa no seu site, o órgão divulgou um comunicado respondendo a “dúvidas gerais” dos bolsistas.


Na página, é recomendado que o estudante entre em contato com a central de atendimento para que seja avaliada a prorrogação da bolsa por até 60 dias para os casos em que a vigência encerrou, mas o estudante não consegue retornar ao Brasil, ou para aqueles que estão no exterior e, por causa da suspensão das atividades acadêmicas, não conseguirão concluir o doutorado no tempo previsto. Apesar de ter medo de problemas na hora de voltar, Fiamma não pretende pedir a prorrogação. “Eu tento não me preocupar muito com isso no momento porque preciso escrever minha tese. Mas, no fundo, sempre ficam as dúvidas”.


Apesar de toda frustração, Fiamma reflete que as dificuldades são parte da vida de quem faz pesquisa. “De um modo geral, ser cientista não é fácil. A gente vem lutando para superar barreiras como falta de visibilidade e de recursos. E por isso cada conquista tem um significado bem maior. No final, nossas conquistas vão ser ainda mais gratificantes. Para o futuro, ela não pensa em outra coisa. “O importante para mim é continuar fazendo ciência”.



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