Uma abordagem por modelagem 3D de alta resolução
Por Fayçal Kessouri
Tradução: Catarina R. Marcolin
O meu trabalho tem como foco a modelagem de sistemas plactônicos utilizando um modelo de acoplamento físico-biogeoquímico. Este tipo de modelo é uma representação virtual 3D dos principais constituintes dos níveis tróficos mais baixos do ecossistema marinho. Inclui plâncton, bactérias e os nutrientes que os suportam sobre condições hidrológicas e forçantes atmosféricas realísticas.
O modelo biogeoquímico com o qual trabalhei mostra o impacto de correntes dinâmicas sobre os nutrientes que suportam o plâncton marinho, incluindo nitrato, fostato e silicato. Como eles estão distribuídos no oceano? Como são consumidos? Quem os consome?
O modelo biogeoquímico mostra apenas uma parte das complexas relações entre diferentes componentes de um ecossistema. Alguns exemplos são como os apresentados a seguir na figura 1 abaixo: matéria inorgânica alimenta o fitoplâncton quando certas condições abióticas estão disponíveis (luz suficiente, camada estratificada dos oceanos), zooplâncton se alimenta de fitoplâncton. A matéria orgânica é mineralizada em inorgânica e serve de alimento para as bactérias, as quais liberam matéria orgânica e inorgânica dissolvidas, e o ciclo continua.
O plâcton marinho é a base de toda a vida marinha. Eles influenciam a pesca, a economia mundial, a saúde humana e tem um importante papel na manutenção da biodiversidade. O plâncton é composto de:
Fitoplâncton: contém a maior massa de produtores marinhos do mundo. Algumas estimativas mostram que os produtores marinhos produzem mais da metade do oxigênio que respiramos na Terra.
Zooplâncton: se alimentam de fitoplâncton (veja também o post da Catarina). Representam a maior migração animal diária do planeta.
Bacterioplâncton e virioplâncton: constituem a maior biomassa do planeta, procariotos e vírus são frequentemente esquecidos quando falamos em redes tróficas marinhas clássicas (leia mais aqui).
O mar Mediterrâneo fica entre três continentes (Europa, África e Ásia) e, portanto, está sujeito a pressões físicas da descargas de rios e de depósitos atmosféricos de matéria orgânica e inorgânica, os quais tem dois níveis de impactos: (1) equilíbrio geral de matéria orgânica e inorgânica em todo o mar, (2) eutrofização (elevação no nível de nutrientes) de águas costeiras.
Um dos nossos achados mais importantes usando este modelo é a quantificação de todas as importações e exportações de matéria nos últimos dez anos entre o Mediterrâneo e os ambientes adjacentes (continentes e oceano Atlântico). Nós estimamos que o Mediterrâneo enriquece o Atlântico em mais de 140 X 109 mols de nitrogênio todos os anos através do estreito de Gibraltar.
O mar Mediterrâneo tem uma característica em comum com o Oceano Atlântico Norte e o Oceano Ártico: zonas de convecção profundas. No Mediterrâneo, uma mistura intensa é observada quase todos os invernos por dois meses. Imagine uma gota de água se movendo do fundo do Mediterrâneo a uma profundidade de 2300 m e subindo para a superfície em um único dia. Esta convecção de retorno a partir de gradientes criados por trocas de calor na superfície e fluxos de água doce é o motor da circulação termohalina global. Esta circulação criada por um gradiente de densidade é estimada estar numa escala de 70 anos no Mediterrâneo e 1000 anos nos oceanos do mundo.
As massas de águas profundas contem altas concentrações de nutrientes, os quais são propagados para a superfície durante eventos de mistura profunda. Quando a mistura se interrompe no final do inverno, alguns dos nutrientes são aprisionados nas águas superficiais e uma grande floração de fitoplâncton é formada, cobrindo uma área de 5 mil a 20 mil km2 (figura 2). Florações de fitoplâncton podem ser tão grandes que podem ser observadas do espaço por satélites e são, portanto, bem modeladas. Essas florações de fitoplâncton ocorrem diretamente acima do local da convecção profunda, o qual é referido como o giro norte do Noroeste do mar Mediterrâneo. Este giro é provocado por fortes correntes ciclônicas (sentido anti-horário no hemisfério norte).
Sobre Fayçal Kessouri:
Atualmente sou pós-doutorando no Departamento de Oceano e Atmosfera da Universidade da Califórnia em Los Angeles, CA, EUA e o meu doutorado foi desenvolvido na Universidade de Toulouse na França (Laboratoire d’Aerologie). Meu campo de trabalho é biogeoquímica oceânica e modelagem 3D de ecossistemas planctônicos, especialmente forçantes físicas. Eu trabalhei com os impactos da convecção profunda no ecossistema planctônico no mar Mediterrâneo e atualmente estou trabalhando com o sistema de ressurgência da corrente da Califórnia e seus impactos na acidificação e hipóxia na costa oeste americana. Meu desejo em conseguir treinamento em modelagem numérica me motivou a trabalhar com um time de físicos para adquirir uma visão mais integrada do funcionamento dos ecossistemas e seus impactos. Isso me ajudou a estudar processos dinâmicos tais como a convecção que sempre me fascinou. Estou convencido de que a modelagem é uma ferramenta perfeita para complementar as redes de observações que tem sido feitas, especialmente se você quer estudar diferentes escalas espaciais e temporais.
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