Por Anônima
Ilustração de Alexya Queiroz
Não é novidade para ninguém que mulheres historicamente ocupam um lugar de apoio a grandes feitos. A expressão “por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher” não é à toa.
Seja por tomarem a frente na economia do cuidado, que envolve todas as tarefas relacionadas à gestão de um lar (com ou sem filhos), enquanto os homens da família focam na carreira, ou sendo da equipe de bastidores no trabalho, seja em posições de secretariado, organização etc. – ou porque nossas ideias são descaradamente roubadas por homens.
Qualquer que seja a razão, se você olhar ao seu redor, verá muitas mulheres trabalhando duro para que alguns poucos homens (com um perfil bem previsível, na maioria das vezes: branco, heterossexual e mais velho) poderem se cumprimentar diante das câmeras como líderes em suas áreas.
O Bate-Papo com Netuno já trouxe isso em diversos textos, como este aqui que destaca que precisamos falar dos homens nas ciências do mar.
Essa é uma daquelas situações que, uma vez que você aprende a identificar, não consegue desligar do radar e acaba percebendo que se repete o tempo todo!
Duas recentes experiências minhas me deixaram com uma vontade danada de desabafar sobre isso...
Em ambos os casos eu estava diante de um momento celebratório de um projeto, que incluía uma bela apresentação sobre nossos resultados e promessas para próximos passos. Em ambos, as equipes em cada projeto eram majoritariamente compostas por mulheres, com cargos desde estagiária até gerente. E, em ambos, as chefias eram ocupadas por homens.
O grosso da organização dos eventos (reserva de salas, contratação de coffee-break, envio de convites etc) ficou sob responsabilidade das equipes, como seria esperado. Então, aqui já temos um baita trabalho de mulheres para fazer tudo acontecer da melhor maneira possível.
Minha inquietação começou quando reparei em outras tarefas. Percebi que não era só eu que estava montando a apresentação que seria feita pela minha chefia masculina, como também outras mulheres de instituições parceiras faziam o mesmo. Ou seja, nenhum homem que falou nos eventos produziu sua própria apresentação, foram as mulheres por trás.
Não posso afirmar, de fato, que em todos os casos o homem porta-voz só recebeu o script e não contribuiu para a construção da fala. Sendo justa, o meu chefe agradeceu o material, fez suas contribuições e em sua fala sempre fez questão de reconhecer o trabalho da equipe.
Ok na escala individual, porém olhando de uma maneira estrutural...
Ao pensar na situação inversa de uma equipe majoritariamente masculina e uma chefia feminina, me pareceu tão improvável que isso fosse acontecer! Aliás, desconheço um grupo que tenha essa configuração... O que vejo são mulheres que, ao buscar oportunidades de maior escalão, acabam acumulando mais atribuições sem delegar a ninguém tarefas que as aliviariam – talvez por falta de equipe (recursos são escassos, afinal de contas) ou, mais provavelmente, para não passar a impressão de que não dão conta de tudo e que não merecem chegar lá. “Como assim, você não é capaz de montar uma apresentação de um projeto que você encabeça?”
Seja como for, quem está no topo subiu lá com ajuda. O que incomoda é que essa ajuda pode muitas vezes ser às custas do bem-estar de quem está na posição de apoio – as grandes mulheres por trás. De novo, em uma escala individual, não parece um grande problema ter uma integrante da sua equipe preparando uma apresentação. Mas quando isso acontece de novo e de novo e, a cada apresentação, é o nome e a cara do homem que aparece, é aplaudida e compartilhada nas redes sociais, invisibiliza-se as mulheres por trás.
Depois desse desabafo, queria compartilhar também algumas sugestões que pensei sobre como quebrar esse ciclo:
- Dar a oportunidade para mulheres da equipe representarem o projeto/laboratório/grupo em apresentações públicas;
- Incluir o nome (e foto) das pessoas da equipe em algum slide de apresentação ou agradecimento, além de cumprimentá-las quando estão no público dando seu devido reconhecimento;
- Se houver divulgação em redes sociais, revisar o material para garantir que o nome das pessoas da equipe seja mencionado.
O problema é estrutural e mais complexo do que inicialmente aparenta ser… falar sobre isso é importante para sairmos do marasmo!
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