Por Izadora Mattielo
Você sabia que o mecanismo para o navio se equilibrar no mar pode afetar o ecossistema marinho e a saúde humana?
Você já se perguntou como o navio se equilibra no mar? Como ele consegue carregar tantas pessoas e mercadorias sem tombar? Acho que é fácil imaginar que há um peso máximo ideal, projetado e calculado pelos engenheiros, de quanto o navio suporta para não afundar. Até aí, ok. Mas e quando ele está vazio? Como ele consegue manter o seu equilíbrio?
A resposta é até que simples: é preciso colocar um peso nele quando está vazio e depois tirar quando for carregar com mercadoria ou pessoas!
No início, foram feitas diversas tentativas com pedras e pedaços de madeira, mas devido ao grande trabalho de colocar e tirar esse material, pensou-se em usar a própria água do mar, já que utilizando bombas seria fácil puxar e soltar essa água quando o navio estivesse atracado. Este método é utilizado até hoje, os navios possuem um tanque de lastro para bombear a chamada água de lastro.
Bom, é aí que começa a minha história!
Imagina um navio saindo da China vazio para o porto do Brasil, onde será carregado com a mercadoria daqui. Pela explicação acima, o navio teria que bombear água da costa chinesa para manter o equilíbrio durante a viagem.
A questão é que ao bombear esta água ela não vem pura e livre de qualquer organismo. Pelo contrário, inúmeros (e inúmeros mesmo) organismos invertebrados e vertebrados são bombeados junto com esta água e ficam aprisionados no tanque de lastro.
Você deve estar se perguntando, mas não existe uma malha para filtrar e impedir a entrada destes organismos? Até existe! Mas não é eficiente, principalmente para os micro-organismos.
Um segundo problema é que, pelas leis da Organização Marítima Internacional (IMO), o navio deveria trocar esta água no mar aberto, pois, teoricamente, os organismos bombeados na região portuária, não suportariam as diferentes condições oceanográficas do mar aberto. Em outras palavras, a temperatura, salinidade, bem como a quantidade de nutrientes e de itens alimentares disponíveis são diferentes nos dois ambientes, o que dificultaria a sobrevivência de qualquer organismo vivo aprisionado no tanque de lastro. Entretanto, não é isso que ocorre. Além de muitos navios não pararem para fazer esta troca de água, muitos organismos são resistentes à viagem e às diferentes condições ambientais.
Aí que vem o terceiro problema: ao chegar ao porto de destino, estes organismos não nativos são descarregados junto com a água do tanque, causando sérios problemas para a fauna e flora local, além da saúde pública.
Ou seja, o navio que tinha saído da China, se não fez a troca em mar aberto e não existe nenhum tipo de tratamento da água dentro do tanque, ao chegar ao porto brasileiro, irá descarregar a água cheia de organismos nativos da costa chinesa! Imagina o impacto ambiental que isso pode causar?
Por isso, há diversos países e grupos da IMO investigando maneiras de sanar o problema. Uma das soluções propostas é o tratamento da água de lastro no tanque durante a viagem. Diversos tratamentos foram propostos: mecânicos, físicos e químicos. Só que ainda estão em testes, pois alguns geram resíduos e outros não são totalmente eficazes.
No meu mestrado trabalhei com microalgas marinhas, que são o fitoplâncton dos mares (já explicado no primeiro post aqui). Por serem microscópicas, passam facilmente pelas malhas (que barram a entrada) para o interior dos navios. Algumas delas podem ser resistentes a quaisquer tratamentos e outras podem ser tóxicas, tanto para outros organismos aquáticos, quanto para seres humanos. Já ouviu falar da maré vermelha? Pois bem, é um grupo de microalgas que causa esse evento (mas teremos um post só sobre isso).
Portanto, meu desafio era buscar formas de erradicar essas algas microscópicas da água de lastro de navios. Eu testei três tratamentos: exposição ao UV, ao ozônio e ao Peraclean, uma substância química, com características parecidas com a da água oxigenada.
O mais interessante desta etapa dos meus testes foi a minha parceria com a empresa incubada no Cietec da Usp, chamada Brasil Ozônio. Quando escrevi o projeto sabia que estes tratamentos eram de grande importância e necessitavam de mais estudos. Eu tinha o UV e o Peraclean, mas como conseguir o ozônio? Foi aí que “googlei” e achei esta empresa do meu lado! Foi a minha sorte!
Não tenham medo de fazer parcerias universidade-empresa. Muito do nosso conhecimento não vai para frente porque o pesquisador não quer se expor e a empresa não vai atrás. Mas não temos nada a perder, só basta ser tudo muito claro e genuíno.
E não é que meus melhores resultados foram com o ozônio? Consegui erradicar até mesmo as microalgas mais resistentes que nenhum outro tratamento tinha conseguido tratar! Além de ser eficiente, este tratamento não gera resíduos para a água tratada, a qual pode ser descarregada ao mar.
Nos próximos posts vou aprofundando mais sobre meus resultados. Mas, caso queiram saber um pouco mais sobre isso, seguem os links da minha dissertação e de uma matéria que saiu no jornal da Usp:
Até a próxima!
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