Por Carla Elliff
“Completo no início da Década do Oceano, uma década como oceanógrafa.”
Não acredito que já faz quase um ano desde que primeiro rascunhei essas palavras – é difícil acreditar também na montanha-russa emocional que foi refletir sobre esses 10 anos.
A razão que me fez parar em meio a esse mundo caótico, respirar fundo e olhar para trás, foi o Prêmio Marta Vannucci de Mulheres na Ciência do Oceano, que tive a honra de receber na categoria Jovem Cientista.
O prêmio, que em 2021 realizou sua primeira edição, é uma homenagem feita pela Cátedra UNESCO para Sustentabilidade do Oceano, ligada ao Instituto Oceanográfico (IO) e ao Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo (USP), e pela Liga das Mulheres pelo Oceano. Profª Drª Marta Vannucci foi uma pioneira nas ciências do mar no Brasil, sendo a primeira mulher a integrar a Academia Brasileira de Ciências como membro associado e atuando como diretora do Instituto Oceanográfico da USP, nas décadas de 1950 e 1960. Todo seu legado inspirou a criação desse prêmio que busca promover, destacar e reconhecer o trabalho de cientistas brasileiras, identificando mulheres inspiradoras (categoria Cientista Inspiração) e premiando jovens cientistas talentosas e promissoras (categoria Jovem Cientista) no campo das Ciências Marinhas (como detalhado lá no blog da Liga das Mulheres pelo Oceano).
Me perguntei muito se eu deveria me candidatar a esse prêmio. Tenho muito orgulho da minha trajetória e conquistas, mas mais do que isso eu tenho gratidão por todos aqueles que caminharam comigo. Não me parecia justo me candidatar a um prêmio por uma história escrita a tantas mãos. Foram semanas de indecisão! (e só aquela primeira frase escrita na carta de apresentação necessária para a inscrição...)
Fui refletindo o que de fato era essa minha indecisão e receio (alô, terapia?!). Sou muito da lógica de que o “não” a gente já tem, então se não custa tentar, bora lá! Mas parecia ser mais difícil esse “bora lá” quando o que estaria sendo avaliado não era um projeto ou artigo que eu escrevi, mas eu mesma – um tópico que eu sou bem tímida para falar (vide o gigante atraso para escrever este post!).
E acho que esse dilema interno que eu estava passando é justamente uma das razões que motivam prêmios como este para mulheres na ciência.
A carreira de cientista tem muitos momentos de rejeição, revisão e escrutínio. Isso é necessário para avançarmos nos nossos conhecimentos, faz parte da base do método científico. No entanto, existem formas e formas de se criticar o trabalho de alguém. Infelizmente, é muito comum vermos pessoas que minam em vez de elevar a confiança de quem estão mentoreando – e muitas vezes indo além e chegando a situações de assédio. Aqui no Bate-Papo com Netuno já compartilhamos diversas histórias nesta temática e vemos como a balança pesa de maneira desfavorável para mulheres.
Para mim, nunca fez sentido o ambiente tóxico de altíssima competitividade da academia. Fui procurando nichos e parcerias que rejeitassem também essa cultura e, felizmente, descobri que existem muitas pessoas que pensam o mesmo! E, não surpreendente, me vejo hoje trabalhando em grupos majoritariamente femininos, onde sinto que pude crescer muito sem medos do trio rejeição-revisão-escrutínio irem para além do necessário.
Um desses grupos é o próprio Bate-Papo com Netuno! Enorme fonte de inspiração e motivação para mim. Aliás, em um dos meus momentos de indecisão sobre me inscrever ou não no prêmio, lembro direitinho de receber uma mensagem da Juliana Leonel no nosso grupo de whatsapp dizendo “Se inscrevam, mulheres!!”, copiando o link do prêmio. E isso é algo que precisamos mais e que está ao nosso alcance: apoio.
E foi com muito apoio que escrevi a tal carta de apresentação. Foram precisamente 300 palavras (o limite máximo!) para contar a “importância prática e/ou teórica de sua trajetória científica” e, olha, ô 300 palavras difíceis! Ao final, porém, eu senti que eu tinha viajado no tempo. Relembrei alegrias e conquistas e me deu uma saudade gostosa da história de como me tornei a profissional que sou hoje.
A cerimônia de premiação foi inteiramente online e lá dividi a mesa com mulheres fantásticas, incluindo a Profª Drª Yocie Yoneshigue Valentin, ganhadora da categoria Cientista Inspiração. Vocês podem conferir como foi pelo canal do YouTube da Cátedra para Sustentabilidade do Oceano (isso é, se não se incomodarem com a quantidade de água salgada que despejo enquanto mal consigo falar!)
Como comecei o post com minha frase de abertura na carta de apresentação, finalizo da mesma forma que fechei minha carta: “Ainda não sei se uma década é muito ou pouco, mas sei que sou muito grata por esses primeiros dez anos e estou ansiosa pelos próximos.”
Muito, muito obrigada.
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Grande cientista! Grande mulher! Bjos. Gerson