Por Natasha Travenisk Hoff
Ilustração por Joana Dias Ho.
Sei que a vida de uma pesquisadora, principalmente de uma em formação, tem muitos altos e baixos, dificuldades de relacionamento, financeiras, de execução de projeto, de amostragem… enfim, “perrengues” não nos faltam! Mas… a parte boa disso é que nem só de “perrengues” vive um pesquisador em formação e, vez ou outra, nos deparamos com pessoas, professoras, pesquisadoras que nos inspiram a ser pessoas e profissionais melhores!
Recentemente, fiz uma entrevista para participar de um treinamento em oceanografia. A entrevista seria em inglês e eu estava muito tensa se entenderia tudo e com as perguntas que me fariam, seja sobre meu currículo, experiências ou sobre a importância deste curso para a minha formação. De fato, essas perguntas vieram… mas também surgiu uma que, ao mesmo tempo, me deixou surpresa e feliz: quem eram os meus “heróis científicos”? E, claro, eu precisava dizer a razão para tal escolha… Rapidamente, três nomes vieram à minha mente e me senti muito privilegiada e feliz com essa escolha. E como justificar?
Como escolhemos nossas “referências” científicas? São aquelas “máquinas” de publicações (para quem é do meio acadêmico, sabe a importância que se dá ao número de artigos que você publica)? São aquelas pessoas que fazem projetos muito diferentes e curiosos? São os ótimos professores? Os que fazem aquelas lousas perfeitas, que todo mundo inveja? São pessoas legais? Os critérios podem ser diversos e creio que apenas uma só qualidade não define uma referência…
Ao longo do meu caminho acadêmico, percebi que um mestrado e um doutorado não se resumem a “apenas” aquele documento que apresentamos e defendemos diante de uma banca. São oportunidades de vivenciar o funcionamento da instituição onde estudamos, o que observamos quando nos tornamos representantes discentes; quando observamos como transmitir o conhecimento, durante as monitorias; quando aprendemos a nos portar diante de uma turma, seja em sala de aula, seja embarcada (para os oceanógrafos que atuam em embarcados cotidianamente); quando lidamos com as situações adversas que surgem durante uma aula ou trabalho de campo; quando nos relacionamos com nossos orientandos… tudo isso, afora as técnicas e amostragem que fazemos para desenvolver propriamente dita a dissertação ou tese! É esse conjunto de experiências que nos formam como mestres e doutores! Claro que há quem discorde…
Finalmente, concluí que meus heróis científicos são definidos pela sua curiosidade, crucial para o desenvolvimento de qualquer trabalho científico, por serem bons pesquisadores, pelo seu empenho em fazer a instituição continuar a crescer, e, principalmente, por serem humanos. Quando eu digo humanos, refiro-me ao sorriso no rosto ao ensinar, à forma com que se relacionam com seus alunos em sala de aula, acolhedores, amigos, estabelecendo uma relação de respeito entre eles; mas também como orientadores, que efetivamente guiam seus alunos, mostrando-lhes essa curiosidade e animação em saber quais vão ser os resultados daquele trabalho, que “colocam a mão na massa” junto com você, que param para sanar as dúvidas e conversar sobre os tais “perrengues”, que acolhem quando estamos com problemas pessoais… somos todos falíveis – eles e nós -, a verdade é essa! Nem todo dia é bom, e precisamos aprender a lidar com isso… erramos, levantamos, aprendemos e refazemos… acertamos e comemoramos também… e ter essas pessoas ao nosso lado, faz com que o aprendizado seja melhor e os tombos menos doloridos. A essas pessoas, o meu muito obrigada!
Sabemos que ser professor e pesquisador hoje em dia no Brasil está cada vez mais difícil, uma constante luta contra a desvalorização desses profissionais, financeiramente e pessoalmente. Portanto, digam-me : quem são os seus heróis científicos? Convido vocês a contar isso a eles! Saber que fazem a diferença para pelo menos um aluno/orientando renova as forças para seguir nessa batalha! Valorizemos os nossos heróis, a ciência, a universidade pública e gratuita, e todos os profissionais que fazem isso acontecer diariamente! Juntos somos mais fortes, saibamos sempre disso!
Os meus heróis científicos! (Fotos de Natasha Hoff, com licença CC BY SA 4.0)
Este post é dedicado a três pessoas muito queridas:
June Ferraz Dias, minha orientadora, grande professora, amiga, companheira de aventuras, meu porto seguro perto mesmo longe;
Marcia Caruso Bícego, a dona do melhor abraço, amiga, dona de um coração enorme, grande pesquisadora, que sempre se empenhou em dar seu melhor para a graduação e ajudar seus alunos de todas as formas;
Michel Michaelovitch de Mahiques, amigo, grande pesquisador e um dos melhores gestores com quem pude conviver.
Sobre a autora:
Apaixonada pelo mar, pela música (tocando ou dançando, já até dei aulas de dança de salão!) e pela família. Sou oceanógrafa, mestre e doutora em Oceanografia (área de concentração Oceanografia Biológica) pelo Instituto Oceanográfico da USP. Atualmente, pós-doutoranda do IOUSP, iniciando os trabalhos em paleoceanografia aplicada a otólitos. Minhas principais linhas de pesquisa são química inorgânica, ecologia de peixes, otólitos e integridade biótica da ictiofauna.
Contato: tashahoff@gmail.com
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